BLOG

Como saber se meu filho(a) tem APLV (alergia ao leite de vaca) ou a outros alimentos fazendo o correto Teste de Provocação Oral (TPO) para fechamento de diagnóstico das alergias alimentares.

Quando uma mãe suspeita que sua criança tem APLV (alergia à proteína do leite de vaca), quase sempre a primeira reação é de insegurança, impotência e até pânico. Ter que mudar uma rotina alimentar não é fácil, restrições devem ser feitas e muitas vezes só cortar leite e seus derivados não é suficiente para trazer qualidade de vida e alívio ao seu filho(a).

Mas isto ocorre pela falta de correta instrução às famílias. Muitas vezes o profissional de saúde suspeita do diagnóstico de APLV e depois solta aquela célebre frase: “tire leite e derivados da dieta”, a consulta acaba e a família tem que fazer o restante sozinha, quase que intuir o que deve ser feito a partir daquele possível diagnóstico que ela acaba de receber, e é exatamente neste momento que milhares de dúvidas começam a surgir. Por mais que a mãe e a família tentem fazer o melhor com a pouca informação recebida, acabam acontecendo atitudes erradas que colocam em risco a saúde da criança.

Como consequência, as reações (de pele, gastrointestinais e/ou respiratórias) continuam a acontecer tirando a paz dentro do lar. A melhor recomendação neste momento é procurar um profissional especializado, diferenciado, que entenda sobre alergia e dieta de restrição e que te explique realmente de forma clara e prática as etapas do processo do tratamento para alergias alimentares e o que a família deve fazer no dia a dia após a suspeita do diagnóstico.

Como nutricionista e mãe de alérgico a alimentos (meu filho João Artur já está curado desde 1 ano e 2 meses de idade da alergia ao leite de vaca, soja e carne de porco) eu entendo sua dor e angústia neste momento. Passei por cada uma dessas difíceis etapas até a cura do meu filho e atualmente busco, através do meu trabalho, auxiliar outras famílias que têm crianças com alergia a algum alimento.

Eu criei este canal com o propósito de tirar dúvidas e explicar os processos ao qual me especializei ao longo dos anos de tratamento com meu filho e que utilizo nas centenas de pacientes que acompanho e hoje, vou contar a vocês o passo a passo a ser seguido pelas famílias de alérgicos, SEMPRE com a orientação médica, para que seja feito pelo médico o correto fechamento do diagnóstico de alergia ao leite de vaca ou a outro alimento. 

Qual a importância de se realizar o teste corretamente?

Realizado há mais de três décadas, o Teste de Provocação Oral (TPO) é o método que tem maior assertividade no diagnóstico de alergias alimentares e pode ser aplicado em qualquer idade. Seus principais objetivos também incluem: 

– Confirmar ou excluir alergia a algum alimento;

– Avaliar a aquisição de tolerância em alergias alimentares potencialmente transitórias (que passam, que curam) como a do leite de vaca, do ovo, do trigo ou da soja;

– Avaliar reatividade clínica (se realmente a criança reage àquele alimento ou não) em pacientes sensibilizados e os com dieta restritiva a múltiplos alimentos;

– Determinar se alérgenos alimentares associados a doenças crônicas podem causar reações imediatas;

– Avaliar a tolerância a alimentos envolvidos em possíveis reações cruzadas (proteínas de alimentos diferentes que são muito parecidas e a criança que reagem a um alimento tem maior chances de reagir a este outro alimento tb);

– Avaliar o efeito do processamento (aquecimento) do alimento em sua tolerabilidade (algumas crianças toleram o leite em preparações/receitas assadas em forno, mas com a ingestão do leite in natura, fazem reação alérgica).

(Quer assistir uma aula que eu dei sobre esse assunto? Assista ao vídeo)

O teste é feito da seguinte maneira: retirar a proteína do leite de vaca (ou de outro alimento suspeito) da dieta e da vida da criança (pois proteínas de alimentos não estão só em alimentos) por, pelo menos, 30 dias da seguinte maneira (em alguns casos, pode ser necessário um período um pouco maior caso a criança não estabilize totalmente neste tempo):

– Se a criança começou a apresentar os sintomas (na pele, respiratórios ou gastrointestinais) durante o aleitamento materno, quem faz a dieta é a mãe.

– Se a criança começou a desenvolver os sintomas alérgicos após a introdução de fórmula infantil a base de leite de vaca, deve-se trocar a fórmula para uma hipoalergênica (a fórmula deve ser prescrita por médico ou nutricionista dependendo da idade, sintomas e situação financeira da família).

– Se a criança começou a apresentar os sintomas da alergia após ela ter ingerido alimento derivado do leite de vaca ou o próprio leite, quem faz a dieta é a própria criança. 

Após estes 30 dias se a dieta, bem como os cuidados no dia a dia, tiverem sido bem orientados e isto faz toda a diferença para o correto fechamento deste diagnóstico (em então cuidado , receber como orientação apenas a frase “tire leite e derivados da dieta” pode por tudo a perder), espera-se que a criança apresente uma boa melhora dos sintomas como:

– Urticária que são placas vermelhas;

– Angioedema que é o inchaço no rosto;

– Dermatite atópica que é uma pele ressecada e com bolinhas;

– Doença do refluxo;

– Diarreia ou prisão de ventre;

– Muco que tem o aspecto de clara de ovo e/ou sangue nas fezes;

– Irritabilidade, pouco sono. 

Então, depois deste tempo de exclusão, a proteína do leite (ou de outro alimento) será reintroduzida na dieta para que o diagnóstico seja feito com exatidão. 

“- Mas Juliana, se eu faço tudo isso e o meu filho(a) melhora então agora você me diz que eu tenho que voltar com o leite de vaca pra vida dele para ver se ele volta a ter os sintomas? “

Isso mesmo, infelizmente é assim que os médicos conseguem fechar com clareza o diagnóstico das alergias alimentares (lembrando que exames só vão auxiliar em alguns casos, mas não fecham diagnóstico. Mas isso é tema para um outro artigo por aqui, para que você não precise ficar fazendo exames de forma desnecessária no seu filho(a) o submetendo-o a picadas doloridas bem como gastando seu tempo e dinheiro à toa). Mas fique tranquila que eu vou explicar direitinho os efeitos desse teste e como ele vai melhorar a vida do(a) seu(sua) filho(a).

Primeiramente tenho que enfatizar novamente que, para se fazer todo este processo de TPO e investigação do diagnóstico correto, é de extrema importância que você tenha orientação completa de um médico especialista em alergia alimentar (alergista se sintomas de pele ou respiratórios e gastropediatra se sintomas gastrointestinais) para saber se, no caso específico do seu filho(a), este teste pode ser feito em casa por você ou se há necessidade de se fazer em uma clínica ou hospital com acompanhamento de equipe médica e toda a medicação necessária caso ocorra uma reação mais grave (como anafilaxia ou choque hipovolêmico). 

Para que o diagnóstico seja feito corretamente, é muito importante não pular nenhuma etapa e realizar o TPO rigorosamente. 

É comum algumas mães não terem uma orientação exata dos produtos que devem ser cortados e das mudanças no dia a dia que devem ser feitas. Eu mesma só recebi a orientação “tire leite e derivados da sua dieta e leia rótulos” da gastropediatra após suspeita de APLV do meu filho e, mesmo sendo nutricionista, tive extrema dificuldade em saber o que fazer e o que eu poderia comer a partir daquele momento.

Acreditem, por muito tempo fiz muita coisa errada, mesmo tentando com todo o meu coração e esforço para acertar. E assim eu continuava sofrendo muito ao ver o meu filho sofrer e não estabilizar das reações que ele apresentava da alergia.

Muitas mães em dieta e muitas crianças acabam consumindo a proteína do leite de vaca sem saber durante este período que tinha que ser de restrição total. Então, ao invés de melhorar, a criança continua fazendo reações e sofrendo com os sintomas. Isso dificulta e até leva a erros de diagnóstico pois, esperava-se que, com a dieta, a criança melhorasse totalmente dos sintomas para que fosse possível fazer a reintrodução do alimento. Voltando o alimento e retornando os sintomas anteriores à dieta, pronto, o médico fecha com segurança: “é alergia ao leite de vaca” ou “é alergia ao alimento tal”.

Por isso é necessário reintroduzir o alimento, para detectar a causa correta dos sintomas pois, se com o retorno do alimento os sintomas não voltarem a acontecer, o médico afasta a questão da alergia ao alimentos ou se, mesmo com a dieta correta os sintomas não acabarem, o profissional irá fazer então outras investigações e/ou exames para fazer o diagnóstico diferencial (averiguar a existência de outra enfermidade). 

Quando a dieta é feita corretamente, os sintomas vão praticamente cessar depois dos 30 dias. Se é realmente a proteína do alimento que está causando os efeitos, quando a mesma for reintroduzida na dieta da criança, os sintomas voltam e com precisão, aí sim o diagnóstico de APLV será fechado. 

Tipos de alérgicos:  

É importante esclarecer que existe diferença nos mecanismos imunológicos envolvidos nas alergias. Então você precisa saber qual é o tipo de alergia que sua criança se enquadra para realizar o teste específico. São 3 categorias: 

IgE Mediada: neste tipo de reação, o organismo produz anticorpos específicos do tipo IgE (Imunoglobulinas E) para as proteínas do leite de vaca (ou para outro alimento) as quais a criança é alérgica. Os sintomas se manifestam praticamente após o consumo ou em até 2 horas depois. Geralmente são: urticária (placas vermelhas disseminadas, geralmente com coceira associada), angioedema (inchaço nas partes moles do rosto como lábios e olhos), vômitos em jato e/ou diarreia que ocorre de forma muito rápida, logo após a ingestão do alimento, dificuldade respiratória, anafilaxia, choque anafilático. Ou seja, são reações mais agressivas e que apresentam riscos maiores. 

IgE Não Mediada: também denominadas mediadas por células, são as reações em que o organismo não produz anticorpos IgE específicos. Nestes casos a reação é desencadeada por outras células do sistema de defesa que não anticorpos. O grande diferencial da reação clínica é que os sintomas são mais tardios, podendo aparecer horas ou dias após a ingestão do alimento. Alguns dos sintomas incluem: vômitos tardios, diarreia com ou sem muco e sangue, sangue nas fezes, cólicas e irritabilidade, intestino preso, baixo ganho de peso e crescimento, inflamação do intestino, assadura e/ou fissura perianal. 

Mistas: algumas crianças podem apresentar os dois tipos, denominadas como manifestações mistas. Nestes casos, podem surgir sintomas imediatos e tardios à ingestão do alimento. Os sintomas dessa alergia são: dermatite atópica moderada a grave (descamação e ressecamento da pele, com ou sem formação de feridas), asma, refluxo, inflamação do esôfago (esofagite eosinofílica), inflamação do estômago (gastrite eosinofílica), diarreia, vômito e dor abdominal, baixo ganho de peso e crescimento. 

Realizar o TPO em casa apresenta risco?

É muito importante que o médico conheça o histórico e as reações que seu filho apresentou durante a vida antes de recomendar o teste assim, ele pode orientar a forma mais segura e monitorar os sintomas após os 30 dias de dieta. Caso a criança seja IgE mediada com risco de fazer uma anafilaxia ou se a criança é IgE não mediada com sintoma chamado Fpies (do inglês Síndrome da Enterocolite produzida por alimentos) que causa vômitos de grande volume, repetitivos e de difícil controle (geralmente após 2, 3 horas após contato com o alimento) que podem vir associados ou não a uma diarreia (após 5, 6 horas do contato com o alimento), letargia e queda de pressão arterial seguida por choque hipovolêmico (pela grande e rápida perda de água do organismo), é necessário realizar um processo mais criterioso que deve ser feito e acompanhado pelo médico em clínica, ambulatório ou hospital. Assim é possível controlar o volume sanguíneo da criança e liga-la ao soro caso, necessário.

Etapas do teste de TPO

Após a avaliação, caso o médico libere para fazer o TPO em casa, você deve seguir algumas orientações. Na hora que reintroduzir a proteína do leite na dieta, eu não recomendo que se comece logo de início um copo de leite de vaca integral, nem para a mãe que amamenta, nem para a criança. Mas por quê?

Porque, supondo que a criança realmente seja APLV, ela terá passado pelo menos 30 dias em dieta de restrição e sem contato com a proteína do leite (se esta tiver sido bem feita e bem orientada) estando a criança livre de sintomas e o organismo limpo de resíduos da proteína. Quando o TPO é feito abruptamente com uma quantidade enorme de proteína, os sintomas da criança poderão aparecer de forma bem mais intensa podendo inclusive reagir desta vez à quantidades menores de proteína que antes ela não reagia, gerando uma sensibilidade ainda maior. 

Assim, eu sempre recomendo aos meus pacientes (quando liberado pelo médico o TPO em casa) etapas gradativas de evolução no contato com o alimento até a conclusão final do processo. Estas etapas irão se diferenciar dependendo de como a criança reage ao alimento: se via leite materno, via fórmula ou via alimento dado diretamente a ela (no caso de crianças já em introdução alimentar).

Se em algum momento do TPO a criança começar a apresentar algum sintoma que pode estar relacionado à alergia, este deve ser suspenso imediatamente e o médico informado para melhor avaliação.

Importante:

Será que podem acontecer sintoma diferentes dos inicialmente apresentados pela criança após a reintrodução do alimento na vida dela? Sim, mas é raro. A princípio, serão monitoradas as reações que ela já havia apresentado. É importante manter a calma e fazer o processo gradualmente para que seja menos agressivo, e reportar sempre ao médico no caso de dúvidas.

Todo cuidado é pouco na hora de cuidar de uma criança alérgica.

TPO de Tolerância

Já o TPO (teste de provocação oral) de tolerância é feito quando a criança, já corretamente diagnosticada com alergia alimentar, passou pela dieta de exclusão da proteína do alimento por um tempo, mas começa a apresentar sinais de que está se tornando tolerante a ele.

Importante ressaltar que a dieta deve sempre ser acompanhada por médico e nutricionista.

Neste caso, a criança é novamente exposta ao alimento que a causava reação alérgica, em pequenas quantidades, em doses crescentes e intervalos regulares e sob supervisão de profissional de saúde. Faz-se então análise de possíveis reações e a quantidade de alimento necessária para iniciar as reações.

Para crianças IgE mediadas ou não mediadas com sintoma de FPIES, o ideal é que o início do teste seja feito sob supervisão médica.

Para a criança IgE não mediada ou mista (sintomas tardios), o processo de introdução alimentar deverá ser mantido em casa e, caso não haja aparecimento de nenhum sintoma, é possível confirmar a tolerância.

Já, se houver qualquer reação no processo, ou seja, aparecimento de sintomas, deve-se observar a fase em que isso ocorreu e a quantidade de alimento ingerido que foi necessário para o início das reações. Anota-se o resultado na ficha de acompanhamento da criança e retornasse a alimentação na fase imediatamente anterior, onde não houve reação.

Para determinar a alta do tratamento e a cura da criança é necessário que esta esteja em contato com a proteína íntegra do leite de vaca por pelo menos 20 dias seguidos, sendo o mais seguro, 30 dias seguidos. A tolerância de pequenas e médias quantidades de proteína do leite pode acontecer devido ao grande período de dieta. Mas fiquem atentos e estejam cientes que algumas crianças podem desenvolver reação mais tardia com essa reintrodução do leite e apresentar reações alérgicas novamente mesmo depois de um bom tempo ingerindo o leite de vaca. Já acompanhei alguns casos assim por isso, segurem a ansiedade e, antes de 30 dias, não solte fogos de artifício AINDA pela cura do seu filho(a).

Todo o processo falado nesse artigo também pode ser aplicado para crianças múltiplas alérgicas, ou seja, que tem alergia a outros alimentos.

Consulte sempre o médico e nunca faça TPO sem orientação de um profissional de saúde. As orientações passadas aqui são gerais e não sobrepõem a orientação do profissional que faz o acompanhamento da alergia alimentar do seu filho(a).